Melina

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“A Montecchio Books inaugura no próximo dia quinze.” Pintada com letras vermelhas e garrafais, a faixa anunciava, de modo ostensivo, o que muitos moradores daquele vilarejo não encaravam como um grande acontecimento. A felicidade em lê-la se resumia em poderem, uma vez mais, acessar gratuitamente a Internet, ler o jornal do dia sem a necessidade de comprá-lo ou então passearem pela seção de discos e filmes – e nunca adentrar pelas estantes literárias.
É outono em Verona, e o enfraquecido sol se reflete nas quentes águas do Lago di Garda, envolto por centenas de turistas com câmeras fotográficas em mãos. Bem ao lado, o monumento de Romeu e Julieta. Feito de mármore, já está desgastado pelo tempo, o que evidencia as assinaturas propositais dos apaixonados que por aqui passaram.
Esta é, definitivamente, a città dos apaixonados. Basta caminhar por poucos minutos por suas ruas para se deparar com incontáveis casais de enamorados, o que é extraordinariamente inspirador – minha gaveta abriga uma nova fotografia a cada dia, embora eu sinta que, para falar de amor, eu poderia viver em qualquer outro lugar deste mundo...
Parada diante de paisagens tão belas, era preciso refletir sobre a direção correta em que deveria posicionar minha câmera fotográfica – nada nunca me pareceu tão correto, no tempo e locais ainda mais certeiros: talvez mais certo do que tudo isso tenha sido o fato de eu estar aqui, e agora, junto ao som do movimento das folhas secas ao chão, ocasionado pelos meus pés. Com a máquina em mãos, dei um passo. E outro passo para a esquerda. E mais um passo, em um trajeto que mais assemelhava-se ao realizado pelos ponteiros de um relógio – embora a minha mente, confusa, pudesse frequentemente ser comparada aos de uma bússola desnorteada.


Resolvi apoiar-me nos muros do lago – não me lembrava de algo mais doce do que o vento roçando a pele de meu rosto e então foi quando avistei, lá longe.
Recolocava as luvas quando percebi algum objeto abandonado sobre um banco. A vontade de aproximar-me era imensa, contudo tive de ter um esforço ainda maior para conseguir fazê-lo — é provável que se a intensidade do vento tivesse aumentado só um pouco, eu poderia ter saído voando. Ou ao menos o meu vestido, sim.
Após alguns minutos, por fim, o fiz. Logo a frente daquele banco, as cinzas e alguns vestígios de lenha ao chão indiciavam que alguém já passara por lá — e, pelo jeito, a não tanto tempo assim.
Sobre o banco, um livro.
Foi abrindo-o que pude perceber o quão abandonado de fato ele estava. As cinzas ao redor do banco indicavam a chama que-arde-sem-se-ver que há pouco se apagou. O vento que desgrenhava meus cabelos anunciava a frieza com que aquela temática era abordada, além do pouco caso com os pensamentos referentes à sua disseminação.


Love. Amore. Lieben. Amour.
O livro dizia que o amor não tem tradução, nem língua nativa,
e que ele tem a capacidade de se multiplicar e se alojar em um cantinho do coração de cada um.
Lá também constava que disseminá-lo é importante – e então sorri. Com uma câmera em mãos, sentia que, com um clique, era capaz de concentrar todo o amor presente nas órbitas do universo em uma só fotografia...
... e eu sinto que nunca irei contentar-me de contente.

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Esse conto é uma homenagem à Melina, uma menina linda que fotografa a vida do ângulo mais bonito possível.
É gostoso encontrar pessoas com um coração tão grande como o seu.
As fotos dessa postagem são todas de sua autoria, e você pode encontrar mais delas acessando o seu Flickr, seu blog ou a sua página no Facebook.


A delicadeza é a flor da humanidade.